sábado, setembro 29, 2007

questões pertinentes

falta de tempo para actualizar este blog. tempo de reflexão também. o e.e.g. de controlo na 4ª feira já não revelava actividade anormal nenhuma. o pedrocas regressou à escola na 5ª feira. os 35,8 mL de xaropes variados põem-no mais sonolento, embora, segundo informação das professoras, não lhe perturbem o nível de atenção. na próxima semana lá iremos à consulta de neuropediatria para fazer o balanço da "crise" e traçar estratégias para os próximos meses. pela frente temos também entrevista com o ortoprotésico para fazer as novas talas receitadas pelo fisiatra, para melhorar a extensão dos membros inferiores. já deveriam estar prontas, mas as férias e os acontecimentos das últimas semanas não permitiram que nos dedicássemos a isso.
fazendo o balanço pessoal deste descontrolo da epilepsia, chego à conclusão de que o pedro já tinha passado por episódios destes em outras fases, só que nós não valorizámos, porque ele ainda não andava e a autonomia dele não era afectada. chamavamos-lhes hipotonias e seguiamos em frente. tinha o seu quê de recusa em enfrentar a realidade, até porque o fisioterapeuta que o acompanhou durante muitos anos sempre nos disse que as hipotonias podiam estar relacionadas com a epilepsia. se o meu raciocínio e o meu olhar sobre o pedro não estivesse contaminado com a minha condição de pai, já teríamos agido há mais tempo, porque cientificamente tinha todos os dados para chegar à conclusão correcta, mas foi preciso ver o traçado do e.e.g. completamente alterado para abrir os olhos. o que me leva a perguntar: até que ponto nós conseguimos olhar para os nossos filhos portadores de deficiência, ou com problemas graves de saúde, com objectividade? até que ponto os nossos sentimentos protectores irracionais não nos confundem a racionalidade?

terça-feira, setembro 25, 2007

home sweet home

estamos em casa, temos o nosso rapaz de volta. 35,8 mL de xaropes variados duas vezes por dia, e.e.g. daqui a dois dias, consulta daqui a uma semana. dois dias de convalescença pela frente, antes de voltarmos às rotinas. mas ainda andam por ali umas crises muito atenuadas...

sexta-feira, setembro 21, 2007

actualização

ainda estamos internados. fiquei um pouco surpreendido com um comentério ao post anterior. não quero de maneira nenhuma deixar aqui a impressão de que viver com o pedro é viver agarrado a um problema. se há coisa que aprendi na vida é que os problemas têm o peso que nós lhes dermos. e quanto mais carga negativa nós lhes pomos, mais embutidos ficam os nossos sentidos e os nossos instintos e, portanto, menos disponíveis para fazer o que temos que fazer aos problemas, que é resolvê-los. também não quero que estes textos pareçam tristes. preocupados, sim, mas tristes, não. o pedrinho está bem melhor, mas ainda não está "au point". já não está em estado de mal epiléptico e recuperou o apetite e a boa disposição. agora a chatice é estarmos aqui fechados o dia todo e inventar actividades para passar o tempo, mas tem que ser. estamos à espera que o e.e.g. regularize um pouco mais e que o novo medicamento que ele vai passar a tomar diariamente (ácido valpróico) atinja bons níveis terapêuticos. para se poder retirar a malfadada fenitoína, que é eficaz, sim senhor, mas deixa-o nauseado. hoje o dia já teve muita agitação da boa. no fundo passámos o dia a brincar, a rabiscar e a ver livros e desenhos animados. vimos novamente o filme preferido do pedro, que é o "spirit", as aventuras e desventuras de um cavalo no oeste americano. é um filme que funciona muito bem com miúdos surdos, devido à quase total ausência de diálogos falados e à expressividade do desenho. e como o pedro adora cavalos, já o viu tantas vezes que já o sabe de cór. no entanto, segue-o sempre atentamente.
mas voltando ao post anterior, ao relê-lo perguntei-me até que ponto não é demasiada a exposição a que nos submeto, ao colocar online factos e sentimentos que sei que a maioria das pessoas em situações semelhantes procura esconder. e pergunto-me porque é que o faço. a única resposta que encontro é a minha aversão às vaidades sociais. uma sociedade tem que ser um espaço verdadeiro e não um espaço de mentiras e falsas aparências. a vida das pessoas com deficiência e dos seus familiares não é um drama pegado, não tem nada a esconder. tem as suas particularidades, tem as suas lutas. e penso que quanto mais as pessoas que não lidam com estas situações de perto souberem sobre essas particularidades e essas lutas, mais despertas e mais sensíveis ficarão. se este blog contribuir para que as pessoas que o lêem desmistifiquem a questão da deficiência e da diferença, então terá cumprido um dos seus objectivos. uma sociedade com tabús e cheia de questões pouco claras, em que é necessário ter o olho azul ou o nariz verde para se ser olhado com respeito, não vale nada. uma sociedade em que a diferença é olhada com muita dó e muita pena, também não. uma sociedade tem que ser um espaço em que todos sejam respeitados, independentemente da cor do olho ou do nariz, ou inclusivamente se tem ou não tem olho e nariz. faz-me imensa confusão que se escondam deficiências, cancros, problemas psiquiátricos, infecções pelo hiv, divórcios, dificuldades financeiras, como se tivéssemos todos que ser supersaudáveis, supersatisfeitos, superqualquercoisa.

quarta-feira, setembro 19, 2007

estamos internados

post escrito num portátil, à cabaceira do pedro no hospital. o pedro dormita a meu lado, depois do dia difícil que passou. ontem depois de acabar o tratamento com o novo antiepiléptico foi dormir a casa, mas quando fez hoje o novo e.e.g. não havia melhoras. já desconfiava, porque as hipotonias manifestaram-se durante a manhã. clinicamente, estava em estado de mal epiléptico, fazendo crises umas atrás das outras. a neuropediatra decidiu ser mais radical e avançar com uma terapêutica mais agressiva, fenitoína, que arrumou completamente com ele durante algumas horas. um estado confusional, agitação psicomotora, depois vómitos. no meio da confusão, uma crise daquelas clássicas, com convulsões. enfim, estamos internados na pediatria, amanhã haverá novo e.e.g., depois logo se verá. custa-me vê-lo nestas fases. custa-me também que o vejam nestas fases, mesmo os profissionais de saúde, porque o pedro não é isto. custa-me que nos façam perguntas do tipo se ele usa sempre fralda ou se consegue tomar um medicamento por uma colher de plástico sem a morder. a mãe do pedro responde logo que ele é um menino como os outros e que faz o mesmo que os outros.
estar aqui, remete-me inconscientemente para os outros internamentos do pedro. a operação em lisboa, as outras descompensações da epilepsia, o primeiro internamento na unidade de cuidados intensivos. já vamos tendo alguma experiência nestas andanças. quando a neuropediatra me propôs o internamento, muito honestamente eu não queria. nem sei bem explicar porquê, mas resisto ao máximo quando se fala em internar o pedro. deve ser esta minha teimosia em que a vida com ele seja o mais normal possível. preferia tê-lo levado para casa e voltar com ele logo de manhã, mas perante as evidências de que se fosse necessário administrar mais alguma coisa por via venosa amanhã ele teria que ser picado de novo, lá cedi. e ainda bem, porque de qualquer maneira ele teria ficado cá por causa dos vómitos. pelos vistos a fenitoína é bem agressiva e provoca alguns efeitos secundários. só espero que faça o efeito desejado, porque não há garantias. aliás, na vida com o pedro, nunca há garantias. se calhar nunca há e a vida é mesmo assim... mas sem me querer queixar ou armar em vítima, isto é um viver sem rede, estar permanentemente disponível para, de um momento para o outro, alterar todas as rotinas, largar tudo e entregar-me a ele, ficar disponível para ele enquanto ele precisar de mim. é o amor que lhe tenho que me dá esta força de entrega incondicional, com naturalidade e sem pensar duas vezes. sei que no meu trabalho precisam de mim, que o resto da família precisa de mim, mas valores mais altos se levantam, para utilizar um lugar comum. também não é nada fácil para a mãe do pedro continuar a trabalhar enquanto nós estamos aqui, não sei qual das posições é mais difícil. mas como eu sou do meio, tenho uma visão técnica da coisa (embora por vezes não consiga pôr o meu olhar profissional a funcionar) e tenho mais estofo e sangue frio nos momentos mais difíceis, normalmente sou eu que avanço.
este post está muito caótico, mas foi escrito ao sabor do pensamento. e nestas alturas o pensamento voa veloz. por vezes quase que é difícil agarrar as palavras e registá-las a crú. espero que ao ler estas linhas, principalmente quem não tem crianças com problemas maiores do que as crianças têm normalmente, reflitam sobre a relatividade da vida e valorizem aquilo que têm. que não se desgastem com problemas menores, como se a vida fosse suposta ser perfeita.

terça-feira, setembro 18, 2007

o meu pedro é um herói

enquanto escrevo este post o pedrinho está com a mãe no hospital. nada de grave. ou então sou eu que já perdi a noção do que é grave e não é. as "pequenas hipotonias", como eu lhes chamava, afinal não são mais do que actividade epiléptica. nos últimos dias, passaram de pequenas hipotonias a grandes hipotonias, de tal maneira que lhe começaram a afectar a capacidade de andar sozinho. depois de algumas quedas e de alguns "galos", resolvemos contactar com a neuropediatra e marcar um electroencefalograma. foi fazê-lo hoje, e foi direitinho para o S.O., para iniciar um novo fármaco antiepiléptico. é uma forma pouco habitual de epilepsia, em que as crises não provocam perda de consciência, apenas perda generalizada de tónus. durante o e.e.g., fez uma série delas, quase sem interrupção, embora se olhassemos para ele nada indicasse que estava a ter crises. continuava a comunicar comigo em língua gestual, completamente desperto. pode parecer-vos estranho eu dizer isto, mas ainda bem que é actividade epiléptica. se não fosse, seria muito mais complicado lidar com isto. conhecer aquilo contra o que temos que lutar é meio caminho andado. quando acabar o medicamento intravenoso, vem dormir a casa, e amanhã vamos voltar para fazer novo e.e.g., 24 horas depois. o meu pedro é um herói. suporta todas estas "sevícias" estoicamente. eléctrodos, picadelas, sistemas de soros, com uma naturalidade que nunca vi em nenhuma outra criança. deve ter sido do primeiro mês de vida passado na unidade de cuidados intensivos, nada o intimida, desde que o pai ou a mãe estejam presentes. é por isto, por ser esta a nossa realidade, que eu não consigo ter paciência para mães e pais que ficam muito preocupados se os seus meninos têm uma dorzinha de garganta, ou uma reles otite, ou uma febre que já dura há dois dias. nem sabem a sorte que têm.

sexta-feira, setembro 07, 2007

será?

e as rotinas vão-se montando aos poucos. esta semana já houve fisioterapia, para a semana começa a terapia ocupacional. a fisioterapeuta achou-o um pouco mais desorganizado a nível motor, mas nada de grave. por outro lado está muito activo e cooperante. ontem à tarde também foi a vez de retomar o a.t.l., que vai frequantar até as aulas começarem. foi tão contente e voltou tão contente que me passou pela cabeça que talvez ele já estivesse farto de nós...

quinta-feira, setembro 06, 2007

Educação Especial


Olá, há muito que não escrevo um post, mas as férias chegaram ao fim e o recomeço ao mundo do trabalho obriga-me de alguma forma a ser mais assídua na utilização da internet e enfim encontrei um site que penso que é do todo interessante pesquisar, uma vez que pode ser útil para todos aqueles que lidam com crianças e jovens deficientes, é o site da Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular, do Ministério da Educação,


As Férias foram boas, aliás, o pai do Pedro já escreveu alguns posts sobre elas e agora sinto-me com mais força para continuar a caminhar enfrente. O Pedrinho continua com alguma hipotonicidade, o que é sempre motivo de preocupação e algum desânimo, uma vez que apercebo-me de alguma frustação por parte dele e nossa, por nem sempre conseguir movimentar-se com a autonomia que tinha conquistado. Espero que neste início de ano lectivo e também com a motivação de voltar a ir para a Escola, ao encontro dos seus coleguinhas e das suas Professoras, o seu tónus volte ao normal.

segunda-feira, setembro 03, 2007

varroterapia?

a constipação do pedrinho evoluiu para uma sinusite purulenta que lhe tem dificultado um bocadinho a respiração. é manifesta a falta de forças, o que exige alguém permanentemente com ele, por causa das quedas. curiosamente, o próprio pedro tem andado irritado com a sua falta de forças, o que tem o seu lado bom. é ele que tem que se controlar e lutar contra isso. com as mil e uma coisas que é necessário fazer, não é fácil alguém estar sempre disponível para estar com ele, mas é sempre possível alguém estar disponível para que o pedro esteja com ele. é uma diferença subtil, esta de estar com o pedro ou o pedro estar conosco. estar disponível para o pedro, ou integrar o pedro naquilo que estamos a fazer. no sábado eu tinha que varrer as folhas caídas ao longo destas semanas numa zona de escadas e pátios, uma zona perigosa para o pedro, portanto, mas decidi avançar com a tarefa, com o auxílio dele. preparei um balde, uma pá e uma vassoura. tinhamos que varrer, apanhar as folhas com a pá, despejar a pá para dentro do balde, e quando o balde estivesse cheio, depejá-lo para um gende saco de plástico de 100 litros. demorei o dobro do tempo, mas a actividade acabou por dar frutos inesperados. lá fomos, escadas acima, escadas abaixo, primeiro varrendo, depois apanhando, depois despejando. qualquer das tarefas exige coordenação motora bimanual, e o pedrinho, logicamente, quis executar todas. varrer, afinal, pode ser uma terapia, e o rapaz não se saiu mal de todo.

"com tomates"

o blog do rodrigo atribuiu há uns tempos o prémio "blog com tomates" ao vida com pedro. é com orgulho que ostentamos o respectivo selo na barra lateral. é suposto nomearmos outros blogs para o mesmo prémio, mas decidi não o fazer directamente. "com tomates" são os autores de todos os blogs que aparecem na barra lateral com a designação "mundos especiais" e "mundos de silêncio". não consigo distinguir mais uns do que outros. "com tomates", são todos os pais e todos os cidadãos portadores de deficiência que não baixam os braços e lutam pela habilitação dos seus filhos e contra as hipocrisias e ignorâncias da nossa sociedade. em comentário a um dos posts dedicados ao josé lima, alguém dizia "Infelizmente é preciso gente assim para abrir os olhos aos nossos governantes, e mesmo assim não sei se vão lá!". não sei se é apenas aos nossos governantes que é preciso abrir os olhos. o respeito e a tolerância não se legislam. numa sociedade verdadeiramente plural e democrática, não é preciso que os governantes intervenham muito. é preciso abrir os olhos aos arquitectos, engenheiros e construtores civis que planeiam e executam os edifícios. é preciso abrir os olhos aos empresários e empregadores, para que vejam que um cidadão portador de deficiência, como o josé lima, tem a vantagem de apreciar mil vezes mais a oportunidade de trabalhar e poder ser uma mais valia de peso para a empresa. é preciso abrir os olhos de muitos pais de coleguinhas dos nossos filhos. é preciso abrir os olhos de todos os cidadãos que estacionam em lugares reservados a viaturas de cidadãos portadores de deficiência. é preciso abrir os olhos a autarquias e gestores de apoios de praia, para que todos tenham acesso a esse meio riquíssimo de experiências que é a praia. é preciso abrir os olhos a todos os que estacionam em cima de passeios e passadeiras dificultando a circulação de peões e cidadãos com necessidades especiais em termos de mobilidade. toda uma revolução de mentalidades.

sábado, setembro 01, 2007

regresso

e essas férias?, perguntavam-nos em comentários ao post anterior. que dizer das férias? são sempre curtas... a viagem foi óptima, a holanda é um país de que gostamos, não foi a primeira vez que lá fomos. uma sociedade organizada e pensada para todos, talvez por razões históricas que deram ao povo holandês uma noção enraizada de sobrevivência colectiva. uma sociedade plural. ficámos mais uma vez com uma pontinha de inveja. diferenças enormes em termos de acessibilidades, practicamente não há escada que não tenha a rampa ou o elevador correspondente. é vulgar ver pessoas sozinhas em cadeiras de rodas motorizadas circulando pelas cidades. primeiros dias em amsterdam, depois andámos à deriva pelo país, no meio de vacas, moinhos, campos cultivados, muita água, autoestradas e zonas de industrialização macissa. descobrimos um pequeno paraíso ecológico na ilha de texel, no norte, e maravilhámo-nos com as gigantescas infraestruturas para controlo do mar do norte. desígnios nacionais que tiveram respostas colectivas nacionais.

tivemos saudades dos nossos filhos, como não podia deixar de ser. do pedrinho, muitas. ao regressarmos encontrámo-lo constipado e cheio de saudades nossas, uma explosão de alegria quando nos viu no aeroporto. as férias continuam para mim mais uma semana, a mãe do pedro regressa ao trabalho na próxima semana. tempo de planificações para o novo ano. regresso às terapias, a.t.l. até ao início das aulas, um novo ano escolar.