segunda-feira, julho 07, 2008

saber viver um dia de cada vez

Na passada sexta-feira, dia 04 de Julho de 2008, recebí por mail o relatório técnico-pedagógico do Pedro, de acordo com a alínea a) do ponto 1 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 3/2008. Relatório esse que devo dar o meu parecer em reunião marcada e na qualidade de encarregada de educação do Pedro. Em anexo a referido relatório foi-me enviado uma checklist sobre os parâmetros funções do corpo; actividade e participação e factores ambientais. Cada um destes parâmetros são ainda divididos em capítulos e quantificados por qualificadores, a saber:


0-nenhuma deficiência; 1-deficiência ligeira; 2-deficiência moderada; 3-deficiência grave; 4-deficiência completa; 8-Não especificada; 9-Não aplicável. Não vou detalhar a cheklist atribuida ao meu Pedro, no entanto posso apenas referir que ficou quantificado com três nas Funções Mentais Específicas. E aqui parei, e pensei o que é que se passa com as pessoas? Receber um mail codificado com tamanha informação é qualquer coisa de desumano, afinal sou mãe do Pedro e se fosse a mãe do António ou da Maria e me comunicassem por mail que o meu filho tinha deficiência completa, o que é que isso significaria, provavelmente morrer naquele instante.


Quando o Pedrinho tinha apenas meses de vida, a neuropediatra decidiu preparar-me para o pior e quando a minha ingénua mente evocou o que significava o pior, a Dra referiu que o pior significava que o meu filho poderia ser um vegetal. O Pedro provou-lhe o contrário, não é nada que se pareça com um vegetal, é uma criança alegre, comunicativa, carinhosa e inteligente, com o tempo veio a adquirir as suas competências motoras, afectivas, cognitivas e sociais e hoje é uma criança de oito anos que tem a sua autonomia de acordo com aquilo que se espera de uma criança de oito anos, claro está com as suas limitações. Agora passados oito anos técnicos do ensino, que são meus colegas apresentam-me um quadro meramente limitativo acerca das competências cognitivas do Pedro e o pior é que não apresentam soluções efectivas, nomeadamente referem no mail que "o Pedro desde muito cedo sempre foi apoiado, portanto estes papeis apenas servem para dizer que ele deve ter, o que já tem, ou seja não temos nenhum outro apoio para lhe prestar além do que já conseguimos dar".

Como já referí em post anterior, a família com uma criança deficiente é uma estrutura complexa e com um equilíbrio frágil que deve ser acarinhada e fortalecida pelos técnicos de saúde e da educação, pois o sucesso dos técnicos de saúde e da educação com as crianças deficientes está intimamente ligado com o equilíbrio destas famílias.
A mim, mãe do Pedro resta-me apenas saber viver um dia de cada vez.

12 comentários:

reb disse...

Mãedo pedro, todo o meu apoio e compreensão!
A partir da lei 30 que surgiu este ano, os meninos são catalogados através de um "catálogo internacional" que se destina a poder apoiar somente casos de deficiencia permanente (sic). Mais nada! Uma medida para excluir quem tb necessitaria de apoio mas não se enquadra nessa lista. Foi a morte do d.l. 319 que era mais humano e se baseava em falhas do ponto de vista pedagógico. Não se falava em deficiencias mas em necessidades educativas especiais, e é disso que se deve tratar, qdo o assunto é escola e aprendizagens.

Qto à insensibilidade dos técnicos de saúde e professores, tens toda a razão. Já vi mães a choraram qdo me relatavam as 1as consultas com os neuro-pediatras dos filhos que, afinal, se tinham desenvolvido, surpreendentemente, bem.
Sabes o que eu acho que seria essencial? que em medicina se aprendesse psicologia!! Porque é nessa área que se aprende o conceito de "empatia" que não é mais do que sermos capazes de sentir o outro. Como é possivel dizer a uma mãe que o filho pode vir a ser um vegetal? Uma vez que a medicina pouco sabe do desenvolvimento dessas crianças, não seria melhor ficarem calados nas consultas de bebés e suas mães?
Estas coisas indignam-me!

CláudiaMG disse...

Olá mae e pai do Pedro.

Também eu me deparei este ano com a famosa "CIF" (Classificação Internacional de Funcionalidade)!!! Pelo que me dissseram são cerca de 1500 códigos para avaliar uma criança.
Como estamos no Programa de Intervenção Precoce, tb a nós nos foi facultada a "Check List" para avaliar as funções do corpo.....enfim! Mais uma forma de classificar as crianças em graus e excluir assim algumas do Programa de Intervenção Precoce.
Nós temos a sorte de termos uma Educadora fantástisca com o Guilheme, que nos tem dado imensa ajuda e muito apoio nesta área.

Beijinhos

Cláudia, Madalena e Guilheme

Anónimo disse...

Eu acredito que mais que olhar para exames, diagnósticos, checklist e classificações temos que olhar para as crianças, para o Pedro, para o Guilherme, para o Lucas, etc...

Tenho visto que a maior parte da vezes são feitos prognósticos que muitas vezes têm consequências brutais nas famílias que não se vêm a verificar mais tarde, temos sobretudo que acreditar, lutar e ajudar os nossos filhos a serem felizes.

Concordo plenamente que temos que saber viver um dia de cada vez e aprender a filtrar a informação que nos chega, de forma a ignorar aquela que se revela não importante e não construtiva.

Cristina
http://blogs.clubedospais.pt/ccsantos

reb disse...

Mãe do Pedro, a lei 3 ( tal como anteriormente o d.l 319/91) só interessa pq legitima os tipos de apoio que uma criança com n.e.e. pode ter.
No artigo 16, está o "menu", do qual se podem escolher um ou vários apoios.
São os seguintes:
a) Apoio pedagógico personalizado
b) adequações curriculares
c) adequações na matrícula
d) adequações no processo de avaliação
e) curriculo especifico individual
f) tecnologias de apoio

Não sei de que tipo de apoios o pedro precisa, mas os pais podem EXIGIR qq uma destas medidas. Da minha experiencia enqto professora de educação especial ficou-me isto: a melhor medida é o apoio individualizado pelo professor da turma ( além dos apoios especializados pela prof de educ. especial). Todas as crianças aprendem, qdo ensinadas individualmente. Deve ficar contemplado no horário da professora e do aluno uma ou duas horas semanais de apoio às aprendizagens que decorrem na aula.
Como estamos em época de fazer horários, é melhor que fique já tudo estabelecido. Bem, não sei se a dinâmica do 1º ciclo é parecida com a nossa...

reb disse...

mãe do pedro, desculpa, esqueci-me completamente que tb és professora e tens acesso à lei 3 de 2008 tal como eu :)
fica a informação para outros pais...
beijinhos

Dina disse...

Olá, não conheço a história do Pedrinho, e vou agora começar a ler o blog.
Também sou mãe de um bebé, o Afonsinho que tem agora 18 meses, com paralisia cerebral, resultante de uma asfixia durante o parto. O Afonsinho também foi declarado, caso sobrevivesse, como TOTALMENTE INCAPACITADO. Hoje, graças a Deus, ao nosso trabalho e à ENORME FORÇA DE VONTADA dele já conseguimos atingir pequeninhos objectivos. Acredimos, que o Afonsinho vai conseguir atingir todos as etapas de desenvolvimento, ao seu ritmo e dentro do seu tempo.
Passámos longos meses de dor, confusão, desorientação, NUNCA fomos apoiados por nenhuma psicóloga. Infelizmente até há bem pouco tempo, por técnicos de saude (médicos, terapeutas e enfermeiras) que são INSENSIVEIS e que tem PEDRAS no CORAÇÃO, Com o tempo fomos fazendo a triagem, ficando com os bons e substituindo o que não PRESTAM, limpar a nossa vida e como diz a Grilinha ficar só com os CORAÇÕES BONS.
Continue a acreditar e a lutar, porque o Pedrinho merece e toda a vossa familia também, afinal o vosso e o nosso caminho é um caminho que se faz caminhando, dia a dia.

Beijinhos

Dina

reb disse...

Obrigada pelas bonitas palavras, mãe do pedro!
Gosto da família do pedro e gosto do pedro. Gosto da vossa força e fragilidade, gosto da verdade! Gosto da união. Do amor que, imagino, é inabalável.
Gosto de saber que há pessoas que não desistem!

Penso que os seres humanos que vivem uma grande dor se tornam melhores que outros a quem a vida pouco ensina.
Através do vosso blog, tive conhecimento de outros blogs de pessoas que enfrentaram uma dor profunda. Em todos encontrei a mesma força retirada das lágrimas, a mesma filosofia de vida ( a vida vai-se vivendo, um dia de cada vez), o mesmo optimismo, a esperança, as vitórias saboreadas, os medos partilhados. A aceitação!

Naõ há dúvida, são pessoas especiais com as quais todos deveriamos aprender!
Um beijo.

Anónimo disse...

Mãe do Pedro,
Também me deparei com esses laudos, que pouco, ou nada acrescentaram na vida da minha filha portadora de P.C.
Os profissionais desta área, na maioria das vezes, são uns insensíveis, ou ser mãe de uma criança portadora de deficiência nos faz mais sensíveis, não importa, o que vale é a força que entregamos a eles todos os dias de nossas vidas, que nos é dada por Deus!
Os parâmetros utilizados por estes profissionais são técnicos, eles falam de números, de escalas, fazem comparações com a dita "normalidade", e nós falamos da alegria de tê-los conosco, de vibrarmos com suas conquistas, enfim falamos línguas diferentes, mas isso não implica dizer que não estejamos lutando dia-a-dia por seu desenvolvimento e inclusão social!
Já sofri e chorei muitas vezes com esses "diagnósticos", mas hoje, só vivo sua presença única o que retribuo com meu amor incondicional, e desta forma os relatórios negativos não me intimidam, acredito no seu potencial e desejo essa mesma força á vc!
Cláudia

reb disse...

O que eu tenho vindo a desobrir, ao ler este e os outros blogs especiais que descobri através deste, é que as melhores pessoas se encontram aqui!
Encontro valores de solidariedade, de partilha, de amor em doses muito maiores do que na maioria das pessoas que vou conhecendo.
Há humanidade, no melhor sentido da palavra!

Grilinha disse...

Pois, compreendo bem a vossa indignação...sinto com o vosso coração. Sinto a mágoa. Mas tenho dificuldade em acreditar em Check lists e profissionais isolados que agem dessa maneira.

Olhem para o vosso Pedrinho.
Sintam vocês. Contrariem os prog´nósticos sempre. Lutem e mostrem que não está correcto.

Acredito que têm muitos pedragulhos para afastar. Sei que há cansaço por vezes. Mas dos fracos não reza a história e acredito que vocês escreverão outras coisas no futuro.

Estou convosco. O Pedrinho tem muito para dar. E não é o CIF que vos diz isso, nem outros prognósticos. Será ele.

Um beijinho

LOBITAS disse...

Vivemos numa sociedade com muita pouca sensibilidade para lidar com casos como o dos nossos filhos no entanto não deveriamos ,mas temos que ser nós a "abrir" as mentes e a demonstrar que somos todos diferentes e apesar de os nossos filhos serem diferentes naquilo que a maioria são iguais, não deixam de ter direito ás mesmas opurtunidadese delhes darem a mesma chance.
Um bem haja por toda a patilha que ao longo destes tempos nos tem brindado.
Tudo de bom
Beijinhos da alcateia

Anónimo disse...

Os diagnósticos ficam sempre aquem da realidade da criança. Também já deitei muitas lágrimas nas primeiras consultas do Pedrocas, mas ao longo do tempo fui verificando que cada criança é um caso.O Pedro tem 13 anos com diagnóstico de Paralisia Cerebral. Está integrado num externato e frequenta o ensino especial.É um miudo inteligente e feliz. As palavras negativas que tenho ouvido dos técnicos de saúde servem principalmente para me dar ainda mais força e lutar pelo rapazinho mais importante da minha vida.
Gosto muito do vosso blog, é muito bom podermos partilhar as nossas experiências.
Beijos para o Pedro

Um beijo