quinta-feira, novembro 23, 2006

língua gestual portuguesa


instigado pela maria, hoje vou falar de língua gestual portuguesa. assim que tivemos a confirmação de que o pedro tinha uma surdez profunda e que a melhor opção para comunicar com ele seria a língua gestual, começamos a ter aulas. cabe aqui falar no livro da emmanuelle laborit, o grito da gaivota, escrito por uma surda francesa e que relata a sua história de vida até ao estrelato como actriz surda. lêmo-lo (eu e a mãedopedro), ainda o pedro era muito novinho, aconselhados pela neuropediatra que na altura o seguia (qualquer dia tenho que o reler). das coisas que retive do livro, foram as consequências da ausência de comunicação que a autora sofreu até aos seis anos. estou a citar de cor, mas diz ela que não sabe como se conseguiu organizar até aos seis anos, não comunicando com ninguém, a não ser com a mãe, com quem tinha uma comunicação intuitiva, numa altura em que os surdos eram educados pela oralidade e as línguas gestuais não eram reconhecidas, antes pelo contrário, eram proibidas. outro dos momentos fulcrais do livro é a descoberta da língua gestual, e isso marcou-nos. sabendo que o pedro tinha problemas associados, e que à partida a sua capacidade intelectual poderia também ter sido afectada, compreendemos a imensa responsabilidade que tinhamos pela frente. tinhamos que aprender suficiente língua gestual para o estimular a desenvolver o simbolismo, ponto fulcral no desenvolvimento intelectual. uma criança ouvinte está rodeada por pessoas ouvintes e o desenvolvimento do simbólico é feito pela repetição das situações em que ela ouve determinado conjunto de sons que correspondem à palavra dita oralmente. uma criança surda, à partida, convive com muito menos pessoas que se expressem gestualmente e por isso essa carga estimulatória é muito menor. tinhamos então que estar preparados para sermos agentes activos nessa estimulação, não tinhamos tempo a perder. iniciámos as aulas integrados numa turma organizada pela unidade local de apoio à criança e jovem surdos, e destinada a familiares e profissionais que lidassem com surdos. tivemos a sorte de ter uma fantástica formadora, uma jovem surda bem disposta, lutadora e de bem com a vida. passada a estranheza do signo ser representado por um gesto e não por um conjunto de sons ou letras, a aprendizagem fez-se como se faz a aprendizagem de outra língua qualquer. primeiro o vocabulário básico (as cores, os números, os graus de parentesco, os objectos de casa, a roupa, as comidas, etc.), depois a gramática, a ordenação dos signos em frases, os diálogos e por aí fora. não posso dizer que hoje em dia fale fluentemente em língua gestual. tivemos interrupções na nossa aprendizagem, devido a más formadoras que foram colocadas na unidade (a de há dois anos não tinha jeito nenhum para a coisa, e a do ano passado faltava muito). mas este ano temos novamente uma boa formadora, e as aulas estão a decorrer muito bem. hoje em dia sabemos que dificilmente o pedro vai conseguir expressar-se oralmente (a ver vamos se é mesmo assim...), e estamos muito contentes por termos dado este passo desde logo. as línguas gestuais são hoje em dia reconhecidas como sendo as línguas maternas dos surdos, e para o desenvolvimento intelectual do pedro foi, e é, superimportante ter pais que falassem a sua.

11 comentários:

Anónimo disse...

Olá Pai do Pedro

Tenho acompanhado a vossa história, e não consigo ficar indiferente. Admiro-o como pai que é, não escondendo os sentimentos e ter a coragem de demonstrar o amor que sente pelo seu filhote.

Um abraço
Fernanda

http://blogs.portaljunior.com/fbarbeiro

Anónimo disse...

O Pedro tem muita sorte em ter uns Pais como vocês. A falta da audição pode ser muito difícil, mas a falta de amor é certamente pior. Bem hajam. É sempre um alento de esperança visitar o vosso blog. Da mãe de outro Pedro.

Grilinha disse...

Sim , claro que é muito importante que falem a linguagem do Pedro...muito...

Tenho muita vontade de aprender...não porque neste momento precise dela...mas desde pequena que tenho essa vontade por causa do meu primo querido (mas que vejo muito raramente, pois mora no Alentejo) ...acho que acabamos só por aprender quando precisamos e quando sabemos que vamos praticar....
Pena minha...talvez um dia aprenda e possa falar com o vosso Pedrinho
Beijinhos

LOBITAS disse...

È muito bom falarem com o Pedrinho na mesma lingua quen ele, pois certamente é muito mais interessante para ele e fica certamente com outro interesse pelas coisas que o rodeiam. Sem dúvida que os laços afectivos dos pais para com o Pedrinho ficam ainda mais apertadinhos. Tudo de bom para voces

Flôr disse...

É uma passagem obrigatória, apesar de muitas vezes não comentar.
Admiro-vos como pais e o Pedro é um menino cheio de sorte por ter uns pais tão interessados e interventivos.
Acho a L.G. muito útil e tenho pena que nos cursos de Ensino Especial, não seja obrigatório a sua aprendizagem.
Desejo-vos toda a força do mundo.

SilenceBox disse...

Não sei o que comentar acerca da Língua Gestual. Não sou contra nem a favor. Sou um dos casos excepcionais. Sou surda profunda de nascença e a minha língua materna é a Língua Portuguesa e não a Língua Gestual. Sou fortamente oralista. Fui estimulada desde muito cedo, ainda era um bebé! Por um lado, a Lingua Gestual é essencial para a comunicação entre surdos e, por outro lado, tem as suas desvantagens... Nem imaginam! Considero a Lingua Portuguesa mais importante que a Lingua Gestual pois está por todos os lados: nos livros, nas revistas, nas disciplinas escolares, na fala dos ouvintes, nas placas de sinalização, etc. E, é a Língua Portuguesa que abre a porta para a sabedoria. Os surdos não devem só usar a Lingua Gestual, também têm que ser estimulados para a Língua Portuguesa desde muito cedo! Têm olhos e é com a visão que fazem a leitura de sons nos lábios. Os pais ouvintes devem dar a conhecer aos filhos a sua verdadeira Língua Materna - a Lingua Portuguesa!!!! Devem mostrar os seus lábios em movimento aos olhos dos filhos surdos. Digo isto em plenos pulmões e também o dizem os surdos profundos e oralistas como eu. Existem muitos. Infelizmente, são pouco reconhecidos porque são uma minoria... Fico bastante chocada que as pessoas falam comigo em Lingua Gestual em vez de oralmente!! Necessito "escutar" diariamente a Língua Portuguesa para não me "encravar", para não ficar pobre linguisticamente...!
Admiro-vos pois fazem todos os possiveis pelo vosso filho!! são pais MARAVILHOSOS!
Muitos beijinhos em forma de flores coloridas para serenar o vosso estado de espirito e em forma de arco-iris para terem coragem e fé.

paidopedro disse...

silencebox: muito obrigado por estas tuas palavras que me puseram a pensar. é evidente que a língua portuguesa abre muito mais portas do que a língua gestual. como tu disseste, está por todo o lado e é essencial no relacionamento dos surdos com os ouvintes. por outro lado, tenho-me apercebido que a língua gestual faz parte de uma espécie de "orgulho surdo" e hoje em dia, o facto dos pais ouvintes saberem língua gestual é um estímulo para que os filhos surdos se dediquem por sua vez à aprendizagem da língua portuguesa. funciona um pouco como uma troca. no caso do pedro, a nossa urgência foi como instrumento de estimulação do desenvolvimento do simbolismo, e acho que funcionou. se tivessemos ficado à espera que o pedro conseguisse fazer leitura labial para comunicar com ele, teria sido tudo muito mais difícil. conheço vários surdos oralistas que usam ambas as línguas e a coisa parece funcionar bem. beijinhos com todas as formas.

Anónimo disse...

Também penso que a língua materna do surdo é a língua portuguesa; a língua gestual uma segunda língua que tem por objectivo não apenas comunicar com a comunidade surda e outros, como também base de desenvolvimento da língua materna, no nosso caso a língua portuguesa.
também fiz um curso de língua gestual portuguesa durante dois anos lectivos na associação portuguesa de surdos. mas uso-a muito pouco,tentando no entanto mantê-la, pois que, com o rafael comunico oralmente, e tal como a margarida, é assim que ele gosta de comunicar connosco. todavia cada caso é um caso, e cada família uma família, com o direito de fazer as suas opções, aquelas que pensa que melhor se adequa ao seu caso específico. foi (e é)assim que sempre entendi.penso mesmo que não devem existir modelos rígidos.
E que bom que foi estar à conversa com a margarida, num fim de tarde,(com o jardim da gulbenkian a presenciar) no seu jeito de falar tão peculiar...

Luis disse...

Olá pai do Pedro,
Sou educador de infância e moro em Lisboa. Ao pesquisar sobre pais ouvintes com filhos surdos, vim parar ao vosso blog. O vosso testemunho veio confirmar e dar-me força para eu não desanimar e continuar a minha tese de mestrado sobre a influência da aprendizagem de LGP por parte dos pais ouvintes na interacção com os filhos surdos. Embora seja ouvinte, tenho uma surdez neurosensorial bilateral e identifico-me muito com a comunidade surda. Considero que a primeira lingua dos surdos é a LGP e a segunda lingua a LP na modalidade escrita e se possivel oral. Se a criança surda adquirir de forma natural a LGP, pelo contacto com outras crianças e adultos fluentes em LGP, depois será mais facil aprender a ler e a escrever em português. Para o meu trabalho de mestrado preciso do testemunho de pais ouvintes sobre como foi importante aprenderem LGP para comunicarem melhor com os filhos, que influência teve na relação afectiva e comunicativa com os filhos. Também eu sinto necessidade de aprender LGP se quero trabalhar com crianças surdas, mas não é facil aprender esta lingua com uma estrutura gramatical diferente da lingua oral mas tão rica e expressiva. Não deixem morrer o vosso blog, coragem, força e continuem. Um abraço do Luís

Anónimo disse...

necessario verificar:)

Anónimo disse...

Primeiro lugar, agradeço muito a vossa apresentação do blog raramente os pais das crianças Surdas façam isso. Sou cidadão Surdo e nativo de Língua Gestual Portuguesa (pura).

Gostaria muito de vos comentar sobre “papel - poder” que nós somos obrigados a seguir:

A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, os direitos humanos são os direitos e liberdades básicos de todos os seres humanos. Normalmente o conceito de direitos humanos tem a ideia também de liberdade de pensamento e de expressão, e a igualdade perante a lei, afirma:
“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”

Há mais,

A Convenção sobre os Direitos da Criança, felizmente o nosso país de Portugal ratificou a Convenção em 21 de Setembro de 1990.

• a não discriminação, que significa que todas as crianças têm o direito de desenvolver todo o seu potencial – todas as crianças, em todas as circunstâncias, em qualquer momento, em qualquer parte do mundo;

• o interesse superior da criança deve ser uma consideração prioritária em todas as acções e decisões que lhe digam respeito;

• a sobrevivência e desenvolvimento sublinha a importância vital da garantia de acesso a serviços básicos e à igualdade de oportunidades para que as crianças possam desenvolver-se plenamente;

• a opinião da criança que significa que a voz das crianças deve ser ouvida e tida em conta em todos os assuntos que se relacionem com os seus direitos.

Não chega? Quer saber mais? Posso informar-vos
Antigamente, em Portugal, a comunicação através da língua gestual era proibida. Os surdos falavam entre si, através da língua gestual, às escondidas. Não havia intérpretes nas escolas, todos os Surdos eram obrigados a comunicar-se oralmente. No entanto, a língua gestual tinha já uma estrutura forte.
Nos termos da alínea h) do n.º 2 do artigo 74.º da Constituição da República Portuguesa:
«na realização da política de ensino incumbe ao Estado (...) proteger e valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades».
Assim sendo, desde 1997, a Língua Gestual Portuguesa passou a ser uma das línguas oficiais de Portugal, junto com a Língua Portuguesa e o Mirandês.
A Lei 3/2008, 7 de Janeiro de 2008, o ministério da Educação prevê a criação de uma rede de escolas de referência para o ensino bilingue de alunos surdos e de uma rede de escolas de referência para o ensino de alunos cegos e com baixa visão.

A definição do abuso: abuso de direito uso excessivo do direito que a lei confere, quer dizer está a fazer tudo contrário a educação de uma criança Surda porque não respeita a vontade de cada criança.

Sou cidadão Surdo e pai de uma criança ouvinte/ bilingue de Língua Gestual Portuguesa portanto sou completamente frustrado os comentários que cometeram o vosso blog, porquê?

“Más formadoras”, quer dizer, são más profissionais mas conseguiu a comunicar o Pedro basicamente a LGP, não foi? Então prefiro dizer os nomes não à respeito da profissão;

Se não gostar um(a) formador(a) e têm direito a apresentar a queixa também os professores são péssimos mas os pais ficaram o bico calado, não achas?

Não poderemos esquecer quem responsabilizar à educação dos filhos, não é só a escola e sim á família.

Deveriam atentar a comunicação e amor dos filhos!